Devido ao grande sucesso da exposição "Nós de Aruanda - artistas de terreiro", a Galeria Theodoro Braga da FCPTN e os organizadores da exposição resolveram prorrogar o prazo da mostra que agora ficará em cartaz até dia 11 de abril.
ATENÇÃO PROFESSORES, ESCOLAS DA REDE PÚBLICA E PARTICULAR, A EXPOSIÇÃO "NÓS DE ARUANDA" GANHOU MAIS DUAS SEMANAS (até 11 de Abril), E ESTAMOS COM A PROPOSTA PARA AS ESCOLAS DE VISITAÇÃO NA EXPOSIÇÃO. com base na Lei 10.639 que torna obrigatória a inserção da História e cultura dos Africanos e Afro-Brasileiros nos conteúdos dos currículos escolares. Galeria Theodoro Braga Horário de 9 às 19 HS. De Seg à Sex. Agendamento: Auri Ferreira 82601610 ou na Galeria: (91) 3202-4313
Duas ou três palavrinhas sobre a memória deste projeto pensado
na universidade e compartilhado nas comunidades de terreiro:
Em uma sociedade fortemente
marcada pela hierarquia de raça e de gênero, nem sempre se valoriza a luta das
mulheres, sobretudo em se tratando da
mulher negra e afroreligiosa, sabemos o quanto ainda é preciso lutar
para libertar essa história do silêncio.
Não podemos negar que muitos
dos nossos direitos já conquistados (e ainda hoje amplamente reprimidos) tem a
mancha do sangue e do suor de mulheres de muita garra e fé que dedicaram e
dedicam até hoje, sua vida em nome da defesa
da liberdade de expressar sua religiosidade, por este motivo, este é
um projeto em homenagem à Mãe Doca, essa
personagem cuja historiografia é importantíssima para a luta do povo
afro-amazônida que pouquíssimas pessoas reconhecem .
Mãe Doca é Nochê Navakoly essa
maranhense de Codó, chama-se Rosa Viveiros, iniciada nas tradições
afro-brasileiras pelo africano Manoel-Teu-Santo. Seu Vodun era Nanã e Toi
Jotin. Sabe-se que a partir do dia 18 de março de 1891, apenas três anos após a
abolição da escravatura, Mãe Doca foi presa várias vezes porque cultuava as
divindades africanas e preservava as tradições de matriz afro-amazônica, e
apesar de toda violência sofrida, ela jamais desistiu de manter aberto o
terreiro que dava lugar para a manutenção das tradições de suas origens negra
africana em seu Terreiro de Tambor de Mina na capital paraense.
A necessidade de inserção dos
artistas de terreiros no circuito de artes visuais surgiu no final de 2011 como
um 'insigth' durante as aulas da disciplina "Poéticas
Afro-amazônicas" para o curso de especialização em 'Saberes africanos a
afro-brasileiros na Amazônia”, ofertado pelo Grupo de Estudos Afro- Amazônicos
— GEAM/ UFPA. Foi nessas aulas, em que tínhamos o objetivo de subsidiar o
ensino de arte e cultura afro-brasileiras e contribuir com a implantação da Lei
10.639/03, que percebemos que a maioria das obras que a história da arte
registra como "arte afro-brasileira" são de artistas
euro-descendentes que não fazem parte de comunidades de territórios
tradicionais negros, e, ao fim, o que percebemos é a presença maciça de um
olhar preconceituoso sobre as práticas tradicionais afro-brasileiras em obras
produzida por artistas que apenas se valem da temática étnico-racial para
usa-las sem nenhum envolvimento ou aprofundamento sobre as questões importantes
para as africanidades na diáspora brasileira.
O problema talvez seja que as
artes visuais parece ser de uso exclusivo das camadas mais abastadas da
sociedade – um mundo restrito às elites (diferente do teatro, da dança e da
música), e se configura como a mais restrita da ditas ‘linguagens artísticas’.
Essa percepção estimulou o GEP Roda de Axé a iniciar o mapeamento da produção artística
nas comunidades de terreiros, e nessa pesquisa encontramos vários artistas que
estão em processo de inserção e legitimação no circuito das artes visuais.
A proposta é reunir todos
eles/nós em um esforço coletivo de realização de uma exposição anual em
homenagem à Mãe Doca para celebrar a resistência pelo direito à consciência do
sagrado de Povos Tradicionais de Terreiros de Matriz Africana no Pará - em uma
exposição que possamos apresentar a diversidade dessa produção
"periférica" como um discurso afirmativo do protagonismo
afro-amazônico na produção de poéticas visuais.
Neste esforço coletivo, em
2013 o Grupo de Estudos e Pesquisa Roda de Axé fez uma chamada pública para a
seleção de artistas, seleção que primou pelo pertencimento a comunidades de terreiros
e interesse em participação na ação artística coletiva.
A primeira versão da
exposição inaugurou em 8 de março de 2013 na Galeria Theodoro Braga da Fundação
Cultural do Pará Tancredo Neves, e dela partticipram: Alan Patrick Fonseca/
Pejigan Oba Gankona; Alex Leovan/ Táta Dianvula; Arthur Leandro/ Táta Kinamboji
(e rede [aparelho]-:); Coletivo Abebê (Samantha Silva e Tatyane Silva); Dellean
Cardoso/ Táta Kitauanje; Deyze Mello; Duda Souza; Edson Catendê e Grupo
Bambarê; Élida Neves; Firmo Leite/ Táta Mukundemim; Jurema de Manezinho; Mametu
Kátia Hadad; Mametu Nangetu; Maurício Franco; Rodrigo Ethnos/ Táta Kafungeji;
Ya Rita Gedeunsu e Lucas Tungenan; Walcir Farias Torres (Juca de Ode); Ysa
Motta; Alef Monteiro; Amadeu de Deus; Isabela do Lago; Jocimara Alves; Lorena
Alves; Marilu Campelo; Raimundo Jorge de Jesus; Renata Silva da Costa; Shirley
Muryel; Simone Araujo e Zélia Amador. Pesquisadores da UFPA e artistas
pertencentes a comunidades de povos tradicionais de terreiros de Belém,
Ananindeua, Marituba e Castanhal no Estado do Pará.
Grupo de Estudos e Pesquisa Roda de Axé/
CNPq-UFPA.
Nós de Aruanda – artistas de terreiro: Nossa segunda Edição:
Quando foi mesmo que ela chegou pela primeira vez a meus ouvidos, não sei. Era apenas uma palavra, mas trazia um cheiro violento de terra e de liberdade, gosto de fruta madura, uma palavra apenas, porém usando paladar e olfato. Por que me embalava tanto como se fossem os braços de minha mãe? Pés se arrastavam, corpos dançavam, vozes cantavam e ela vinha clara e sonora, não se explicando ou definindo, mas evocando lembranças, saudades, passado, distante país, tempos idos, mocidade, vida vivida... Aruanda é o país que sempre trazemos dentro de nós, país de Liberdade e de Paz, país sem desigualdades nem ódio, sem injustiças ou crueldades. (...) Aquele que carregamos como uma arma ou uma joia tão brilhante, pois foi por nós construído, vivido, criado, e por nós defendido. (...) Em Aruanda o lírio é mais lírio e as estrelas brilham com maior intensidade, porque tomamos parte direta na construção de toda a paisagem."
Eneida de Moraes (“Aruanda” [crônicas], Livraria José Olympio Editora – Rio de Janeiro, 1957)
Aruanda é uma referência ao porto de São Paulo de Luanda, lugar de onde partiam os negros sequestrados e trazidos ao Brasil na condição de escravos, e a referência ficou na memória coletiva como o lugar onde se encontraria novamente a liberdade que vinha com as lembranças do continente de origem. Aruanda chama, Aruanda acolhe, Aruandas dão-se as mãos!
Nós de Aruanda, nossas Aruandas, nosso passado, nosso presente e nosso futuro! E ao mesmo tempo um tempo-lugar-fantasia-documento de nós, sobre nós. Nós que somos filhos e filhas de tantos santos quanto são os tempos das Áfricas amazônidas. Espaços-tempo reunidos para superar concepções que separam a arte da religiosidade e das tradições afro-brasileiras. Arte-Aruanda deve ser entendida como território tradicional negro que tem uma vontade imensa de transpor esse muro gigantesco que separa comunidades tradicionais do mundo branco normatizado.
Na contracorrente da indústria cultural, nós de Aruanda caminhamos em qualquer lugar e transitamos por estrada trilhada entre folhas que não separam a vida da arte, caminhamos para a política da construção do nosso lugar em todos os lugares. Misturados ao solo que nos abriga, somos parte desta terra preta, terra fértil, que alimenta novos brotos em território/terreiro que gera a vida!
Vidas exuberantemente diversas, selvagens, fortes, mágicas, e, porque não, criativas...
Verás de tudo um pouco, de memórias, objetos do cotidiano, oferendas, práticas ritualísticas, enfrentamento político, afirmação de identidades a construir sonhos, narrativas e poéticas.... Práticas artísticas diversificadas, e se por aqui a arte te parecer mais viva, é porque revertemos a violência colonizadora para nos tornarmos paisagem de reconstrução do cosmos cultural sustentado em afetos.
Arthur Leandro, Isabela do Lago e Aurilene Ferreira
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