quinta-feira, 25 de abril de 2013

É racismo institucional? E se não não tem diretriz, substituam a diretoria,

Mesa diretora do fórum no Mosqueiro, ao centro a sra. Roberta Gusso.
Depois de meses sem nenhuma notícia da CEPIR/ SEJUDH-PA, e mais de um ano sem reuniões do Conselho Estadual de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, finalmente, num sinal de existência de uma Coordenadoria de Igualdade Racial, semana que passou recebemos um email com convite para participar da etapa ,metropolitana dos fóruns micro-regionais de igualdade racial do Estado do Pará, promovidos pela dita coordenadoria. 

Eis que articulamos transporte e uma comitiva formada por mim, Táta Kinamboji, e por Mametu Kátia Hadad, Byany Sanches e Elisangela Moraes, saiu do centro de Belém pra uma viagem de quase duas horas pelos 60 Km que separam a área central da capital do distrito na ilha do Mosqueiro. 
Além do trânsito, tivemos de enfrentar a desinformação quanto ao local do evento, que de última hora foi transferido do auditório da agência distrital para o Centro Cmunitário do Sucurijuquara, e que ao fim aconteceu numa escola na estrada Carandanduba - Baía do Sol. 
Povos tradiconais de matrizes africanas foram excluídos.
Mas chegando lá, nosso primeiro estranhamento foi perceber que nesse Fórum de Mosqueiro não havia representantes de lideranças de povos tradicioanais de matrizes africanas, ninguém de terreiro. E assim descobrimos que nós, povos tradicionais de matrizes africanas, somos invisíveis para os olhos da Diretoria de Cidadania e Direitos Humanos da SEJUDH e também para a Agência Distrital do Mosqueiro da Prefeitura de Belém, e que para o poder público nós não existimos na Ilha do Mosqueiro, mesmo que exista mapeamento de terreiros no município de Belém que permite identificar quase cinqüenta casas que abrigam comunidades destes povos tradicioanis naquela ilha,
É, no mínimo, muito estranho a forma como o desgoverno do Pará, através da diretoria de cidadania e direitos humanos da SEJUDH, e da sua CEPIR desprovida de coordenação, está desencaminhando as políticas de promoção da igualdade racial. 
Mais estranho, ainda, é essa tal de "Dra Roberta" que está na diretoria de cidadamia e direitos humanos da secretaria, e é alguém que usa da sua autoridade pra interromper a fala das lideranças de quilombo, como ela fez com o sr. José Santos, lideranca quilombola de Tomé Açu, cuja fala foi silenciada por intervenção da sra. Roberta Guzzo.
O despreparo da equipe diretora da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos do Pará para o trato com os movimentos sociais e com as comunidades e os povos tradicionais é evidente, e esse despreparo foi mais que revelado quando os gestores, da Prefeitura e do Estado, não souberam responder aos jovens líderes do quilombo de Sucurijuquara quando estes indagaram dos motivos daquela reunião.
Maria da Paixão Costa e Byany Sanches, conselheiras municipal e estadual, representantes dos movimentos sociais negros.

E foi preciso que nós, lideranças do movimento negro e lideranças de povos tradicionais de matrizes africanas, tomássemos a palavra para informar da convocação da III Conferiencia Nacional de Promoção da Igualdade Racial por parte da Presidente Dilma, assim como do seminário que vai acontecer com a presença da Ministra Luisa Bairros para debater "Territórios tradicionais negros: desenvolvimento e enfrentamento ao racismo", que vai acontecer em Belém em 17 de maio, daqui a mais ou menos um mês.
Com toda essa desinformação e desmobilização promovida pela CEPIR/ DCDH da SEJUDH-PA, alguém ainda se espanta de ninguém do governo ter apresentado informações sobre o planejamento da conferencia estadual de promoção da igualdade racial?
Táta Kinamboji debateu a situação dos terreiros.
Além do despreparo na discussão e encaminhamento de políticas públicas de igualdade racial,a organização do evento não se preocupou com a infra-estrutura básica, e o evento nem água tinha, e a água de beber chegou no local da reunião depois das 11 da manhã, e quando partimos de volta pro centro da cidade, as 14h, ainda não havia chegado o almoço dos participantes... 

A situação de descaso com que a SEJUDH tratou da infra-estrutura para receber o povo negro no Mosqueiro, pode ser considerada como Racismo Institucional...
Enfim, o saldo positivo é que a revolta diante da situação que encontramos na ilha, possibilitou a reunião de lideranças durante o fim de semana e a agenda de uma audiência com o secretário José Acreano Brasil Jr, que já está marcada para a segunda-feira, dia 29 de abril, as 11h, no gabinete do secretário.


Marcílio Medeiros e Mametu Kátia Hadad, com as mestras do Sucurijuquara.

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Sobre a Lei Valmir Bispo e a representação nos fóruns.

Reunião do GT no Seminário Pró-regulamentação do SMC, Lei Valmir Bispo. Foto de Carlos Pará.

Já faz um tempo que tenho recebido convites para que nós, agentes e fazedores das culturas afro-amazônicas, tomemos parte do Fórum Municipal de Cultura (Belém/PA), e eu to batendo contra a nossa participaçnao e dizendo que o fórum de teatro se travestiu de fórum de cultura para negociar aquilo que eles queriam na Lei Valmir Bispo, e agora, com a Lei aprovada, nossa presença vai apenas referendar aquilo que já está decidido.
Ora, enquanto a Lei estava em discussão as nossas falas não foram ouvidas, e nós temos fóruns próprios de duscussão e proposição, então proponho que a gestão pública municipal, estadual e federal, chame nossos fóruns e organizações se realmente querem ouvir as necessidades do nosso povo, é melhor do que tentar imbuir o forum municipal de cultura de uma diversidade que ele não representa.
A implantação do Sistema Municipal de Cultura é uma disputa de espaço político, e eu faço uma avaliação que a LEI Valmir Bispo não nos favorece, pois embora tenhamos a cadeira de comunidades tradicionais, é uma só e não considera, por exemplo, que Belém tem comunidades ribeirinhas – somos um município insular, - comunidades quilombolas – como a comunidade Sucuri-Jaguara, no Mosqueiro - , e os povos tradicionais de matrizes africanas – , e se considerássemos apenas estas, já seriamos três (3) assentos para conselheiros difetrentes defendendo interesses diferenciados. Mas se fossemos, ainda que o Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia - PNCSA - nos mapeou com o selo do IPHAN em seis (6) identidades diferentes de matrizes afro-amazônicas, para as comunidades tradicionais teríamos de ter sete (7) assentos nesse conselho.
No mesmo sistema de exclusão, todas as manifestações culturais de origem afro-amazônica estão restritas a um conselheiro que tem de ser capaz de defender os interesses da capoeira, do reggae, do rap, do samba, do pagode, do afoxé, dos b-boys e b-girl, da moda e das linguagens artísticas que tenham como mote e questão a origem étnica e racial.
Mas ao mesmo tempo em que aqueles que formam o Fórum Municipal de Cultura ignoram a nossa realidade, eles separaram fotografia das artes visuais e aumentaram as representação das ditas linguagens artísticas, que podemos traduzir em linguagens da elite. Isso pode parecer natural, até como reconhecimento da importância da fotografia no bojo das manifestações artísticas de Belém, mas é importante observar que o conselho municipal é quem vai decidir sobre a distribuição de verba pública através do financiamento pelo fundo de municipal de cultura, e isso significa dizer que quando eles se juntarem em defesa dos interesses dessas linguagens de elite, a nossa fatia do bolo vai permanecer no "quase nada" que sempre foi.
Portanto , temos de tencionar para que numa futura provável mudança na Lei a gente tenha mais assentos para os povos tradicionais e para as linguagens artísticas de periferia, as afro-brasileiras e as chamadas culturas populares.... senão nada muda.

Ananindeua/PA, 17 de abril de 2013.

Arthur Leandro, Táta Kinamboji uá Nzambi.
Titular do Conselho Nacional de Políticas Culturais, representante da Setorial de Culturas Afro-brasileiras.

domingo, 7 de abril de 2013

MinC: CNPC negou políticas afirmativas para a terceira Conferência Nacional de Cultura.

leia errata sobre esta postagem aqui
Arthur Leandro, ao lado de Edna Marajoara (em primeiro plano) durante reunião do CNPC em março de 2013.

MinC: CNPC negou políticas afirmativas para a terceira Conferência Nacional de Cultura.

De resto, aliás, não seria verdade que quando o homem quer fazer uma revolução, ou melhor, quando decide mudar as condições de seu mal-estar, deve necessariamente dar início às mudanças na esfera cultural, operando nas escolas, nas universidades, na cultura, na arte e, em termos gerais em tudo aquilo que diz respeito à criatividade? A mudança deve ter início no modo de pensar, e só a partir desse momento, desse momento de liberdade, será possível pensar em mudar o resto. (BEUYS, Joseph. A revolução somos nós. In Escritos de Artisitas: anos 60/70. COTRIM, Cecilia; FERREIRA, Glória (org))

A questão pertinente aqui é o por que de tanta resistência do Conselho Nacional de Políticas Culturais do Ministério da Cultura – CNPC/ MinC – em aprovar um percentual de cotas raciais e, ainda, cotas para povos e comunidades tradicionais, no regimento da 3ª Conferência Nacional de Cultura – III CNC.
Esta é minha análise das reações dos conselheiros nacionais, tanto os da sociedade civil, quanto os conselheiros representantes das instituições de governo na 18ª reunião do CNPC/MinC, que aconteceu em Brasília nos dias 6 e 7 de março de 2013, reunião em que propus um sistema de cotas de delegados representantes de culturas afro-brasileiras, de culturas indígenas, e cotas também para povos e comunidades tradicionais desde as conferências municipais, como garantia de participação dos agentes das culturas negras das periferias urbanas, assim como, no caso de povos e comunidades tradicionais, dos agentes culturais das comunidades quilombolas e dos povos tradicionais de matrizes africanas, que na maioria das vezes sobrevivem à própria sorte e na invisibilidade das gestões municipais. Proposta que foi rejeitada pela maioria absoluta dos conselheiros presentes no momento da votação, e com essa negativa a maioria dos agentes das culturas das minorias vai permanecer sem garantias nenhuma de eleger delegados nas conferências municipais, e com isso, com esse universo de exclusão nas conferências municipais, e, ainda, considerando que só poderá ser delegado estadual quem tiver sido eleito delegado municipal, é bem provável que o resultado desta terceira Conferência Nacional de Cultura em novembro próximo, seja o mais elitista e discriminatório de todas as conferências que fizemos até agora.
Parece que na cultura ninguém acompanhou os debates, inclusive no Superior Tribunal de Justiça, sobre o Estatuto da Igualdade Racial (LEI Nº 12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010.) que diz em seu Art. 2O, que: “É dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades, reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independentemente da etnia ou da cor da pele, o direito à participação na comunidade, especialmente nas atividades políticas, econômicas, empresariais, educacionais, culturais e esportivas, defendendo sua dignidade e seus valores religiosos e culturais.”, e nem tampouco parecem ter ouvido falar na regulamentação da Lei nº 12.711/2012, a LEI das cotas no ensino superior público, que reza que também será levado em conta percentual mínimo correspondente ao da soma de pretos, pardos e indígenas no estado, de acordo com o último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Posso dizer, sem a possibilidade de equívoco, que os dirigentes do Ministério e a maioria dos conselheiros da Cultura que representam a sociedade civil, estiveram surdos durante todo o debate sobre as políticas afirmativas que se desenrolaram na sociedade brasileira nos últimos dez ou doze anos, ou então a gestão cultural deve ser parte de um universo intergalático onde todas as diferenças devem estar resolvidas, e isso explica que no CNPC tenha tanta gente tão indiferente à questão racial brasileira.
A outra hipótese que vislumbro é que a negativa às garantias de participação dos povos tradicionais e do recorte étnico-racial nas esferas de diálogo da sociedade com a gestão pública é intencional e visa estagnar a expansão das conquistas dessas minorias na esfera cultural e manter os privilégios do financiamento estatal nas mãos das manifestações artísticas da elite (euro-)brasileira, que aparentemente se fazem maioria entre os conselheiros do CNPC.
É de estranhar que até Márcia Rollemberg, conselheira representante da Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural (SCDC/MinC), de quem, teoricamente, se esperava a defesa da garantia de participação das minorias, tenha votado e até defendido posicionamento contra as cotas. Assim como é de estranhar que nem o/a conselheiro/a representante da Fundação Cultural Palmares, e muito menos o/a conselheiro/a representante da SEPPIR, estivessem presentes no plenário do CNPC quando da discussão do regimento da III CNC, em especial numa discussão de garantia de participação em cotas raciais.
A decisão do pleno do conselho nacional de políticas culturais revela o conservadorismo dos conselheiros que representam a sociedade civil, cuja maioria se mostrou indiferente à questão das cotas étnico-raciais e negaram a tradição artística brasileira que, desde a época de Castro Alves, vinha se colocando na vanguarda das lutas sociais, e que nas questões raciais levantou bandeiras contra a escravidão e contra o racismo no Brasil; e revela também o conservadorismo dos gestores do MinC, também indiferentes às diretrizes gerais de promoção da igualdade da gestão de governo que eles participam.
Ao final das contas é uma decisão que vai na contra-mão das diretrizes do governo e da sociedade brasileira, e podemos até especular que tal decisão vai colocar o Ministério da Cultura como um apêndice estatal no que se refere às garantias dos direitos de participação política das minorias.

Ananindeua/PA, 7 abril de 2013.

Arthur Leandro/ Táta Kinamboji
Conselheiro, representante das Culturas Afro-brasileiras no CNPC - 2013/15.

PS: Não poderia deixar de registrar, com a ênfase necessária, que a defesa dos interesses das Culturas Afro-brasileiras na 18ª reunião do pleno do CNPC contou com a participação precisa de Pai Paulo de Oxalá/ Paulo César Oliveira, também conselheiro pelas Culturas Afro-brasileiras no biênio 2013/15; de Isaac Loureiro, representante das Culturas Populares (2013-15); de Edna Marajoara, representante do Patrimônio Imaterial (2013-15); e de Antônio Amaral Ferreira, ex-conselheiro de Culturas Afro-brasileiras do CNPC no biênio 2010/12.