Arthur Leandro, ao lado de Edna Marajoara (em primeiro plano) durante reunião do CNPC em março de 2013. |
MinC: CNPC negou políticas afirmativas para a terceira Conferência Nacional de Cultura.
De
resto, aliás, não seria verdade que quando o homem quer fazer uma
revolução, ou melhor, quando decide mudar as condições de seu
mal-estar, deve necessariamente dar início às mudanças na esfera
cultural, operando nas escolas, nas universidades, na cultura, na
arte e, em termos gerais em tudo aquilo que diz respeito à
criatividade? A mudança deve ter início no modo de pensar, e só a
partir desse momento, desse momento de liberdade, será possível
pensar em mudar o resto. (BEUYS,
Joseph. A
revolução somos nós.
In Escritos
de Artisitas: anos 60/70.
COTRIM, Cecilia; FERREIRA, Glória (org))
A
questão pertinente aqui é o por que de tanta resistência do
Conselho Nacional de Políticas Culturais do Ministério da Cultura –
CNPC/ MinC – em aprovar um percentual de cotas raciais e, ainda,
cotas para povos e comunidades tradicionais, no regimento da 3ª
Conferência Nacional de Cultura – III CNC.
Esta
é minha análise das reações dos conselheiros nacionais, tanto os
da sociedade civil, quanto os conselheiros representantes das
instituições de governo na 18ª reunião do CNPC/MinC, que
aconteceu em Brasília nos dias 6 e 7 de março de 2013, reunião em
que propus um sistema de cotas de delegados representantes de
culturas afro-brasileiras, de culturas indígenas, e cotas também
para povos e comunidades tradicionais desde as conferências
municipais, como garantia de participação dos agentes das culturas
negras das periferias urbanas, assim como, no caso de povos e
comunidades tradicionais, dos agentes culturais das comunidades
quilombolas e dos povos tradicionais de matrizes africanas, que na
maioria das vezes sobrevivem à própria sorte e na invisibilidade
das gestões municipais. Proposta que foi rejeitada pela maioria
absoluta dos conselheiros presentes no momento da votação, e com
essa negativa a maioria dos agentes das culturas das minorias vai
permanecer sem garantias nenhuma de eleger delegados nas conferências
municipais, e com isso, com esse universo de exclusão nas
conferências municipais, e, ainda, considerando que só poderá ser
delegado estadual quem tiver sido eleito delegado municipal, é bem
provável que o resultado desta terceira Conferência Nacional de
Cultura em novembro próximo, seja o mais elitista e discriminatório
de todas as conferências que fizemos até agora.
Parece
que na cultura ninguém acompanhou os debates, inclusive no Superior
Tribunal de Justiça, sobre o Estatuto da Igualdade Racial (LEI Nº
12.288, DE 20 DE JULHO DE 2010.) que diz em seu Art. 2O, que: “É
dever do Estado e da sociedade garantir a igualdade de oportunidades,
reconhecendo a todo cidadão brasileiro, independentemente da etnia
ou da cor da pele, o direito à participação na comunidade,
especialmente nas atividades políticas, econômicas, empresariais,
educacionais, culturais e esportivas, defendendo sua dignidade e seus
valores religiosos e culturais.”, e
nem tampouco parecem ter ouvido falar na regulamentação da Lei nº
12.711/2012, a LEI das cotas no ensino superior público, que reza
que também será levado em conta percentual mínimo correspondente
ao da soma de pretos, pardos e indígenas no estado, de acordo com o
último censo demográfico do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE).
Posso
dizer, sem a possibilidade de equívoco, que os dirigentes do
Ministério e a maioria dos conselheiros da Cultura que representam a
sociedade civil, estiveram surdos durante todo o debate sobre as
políticas afirmativas que se desenrolaram na sociedade brasileira
nos últimos dez ou doze anos, ou então a gestão cultural deve ser
parte de um universo intergalático onde todas as diferenças devem
estar resolvidas, e isso explica que no CNPC tenha tanta gente tão
indiferente à questão racial brasileira.
A
outra hipótese que vislumbro é que a negativa às garantias de
participação dos povos tradicionais e do recorte étnico-racial nas
esferas de diálogo da sociedade com a gestão pública é
intencional e visa estagnar a expansão das conquistas dessas
minorias na esfera cultural e manter os privilégios do financiamento
estatal nas mãos das manifestações artísticas da elite
(euro-)brasileira, que aparentemente se fazem maioria entre os
conselheiros do CNPC.
É
de estranhar que até Márcia Rollemberg, conselheira representante
da Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural (SCDC/MinC), de
quem, teoricamente, se esperava a defesa da garantia de participação
das minorias, tenha votado e até defendido posicionamento contra as
cotas. Assim como é de estranhar que nem o/a conselheiro/a
representante da Fundação Cultural Palmares, e muito menos o/a
conselheiro/a representante da SEPPIR, estivessem presentes no
plenário do CNPC quando da discussão do regimento da III CNC, em
especial numa discussão de garantia de participação em cotas
raciais.
A
decisão do pleno do conselho nacional de políticas culturais revela
o conservadorismo dos conselheiros que representam a sociedade civil,
cuja maioria se mostrou indiferente à questão das cotas
étnico-raciais e negaram a tradição artística brasileira que,
desde a época de Castro Alves, vinha se colocando na vanguarda das
lutas sociais, e que nas questões raciais levantou bandeiras contra
a escravidão e contra o racismo no Brasil; e revela também o
conservadorismo dos gestores do MinC, também indiferentes às
diretrizes gerais de promoção da igualdade da gestão de governo
que eles participam.
Ao
final das contas é uma decisão que vai na contra-mão das
diretrizes do governo e da sociedade brasileira, e podemos até
especular que tal decisão vai colocar o Ministério da Cultura como
um apêndice estatal no que se refere às garantias dos direitos de
participação política das minorias.
Ananindeua/PA,
7 abril de 2013.
Arthur
Leandro/ Táta Kinamboji
Conselheiro,
representante das Culturas Afro-brasileiras no CNPC - 2013/15.
PS:
Não poderia deixar de registrar, com a ênfase necessária, que a
defesa dos interesses das Culturas Afro-brasileiras na 18ª reunião
do pleno do CNPC contou com a participação precisa de Pai Paulo de
Oxalá/ Paulo César Oliveira, também conselheiro pelas Culturas
Afro-brasileiras no biênio 2013/15; de Isaac Loureiro, representante
das Culturas Populares (2013-15); de Edna Marajoara, representante do
Patrimônio Imaterial (2013-15); e de Antônio Amaral Ferreira,
ex-conselheiro de Culturas Afro-brasileiras do CNPC no biênio
2010/12.
publico a troca de emails que recebi a partir desta postagem
ResponderExcluireste aqui foi no Facebook
ResponderExcluirde Flavia Vivacqua: Pois é Arthur Leandro, percebo que falta mesmo um dialogo mais profundo sobre as politicas afirmativas no setor cultural... ao mesmo tempo que começa haver uma série de editais voltados exclusivamente para os afrodescendentes e a cultura negra. Acredito que o tema está aí, pautado pelo movimento e tornando-se cada vez mais visível e forte...
Enviadas: Segunda-feira, 8 de Abril de 2013 20:31
ResponderExcluirAssunto: ENC: Composição do CNPC
Prezados,
Soubemos da cobrança sobre a ausência da SEPPIR na última reunião do CNPC. Gostaríamos de informar que, infelizmente, a SEPPIR não tem assento neste colegiado, conforme poderão verificar nos dados abaixo cobre a composição do Conselho em questão.
De qualquer maneira, não poderia deixar de parabenizá-los pelas defesa inconteste da pauta das comunidades tradicionais, que também é uma pauta nossa.
Profª Silvany Euclênio
Secretaria de Políticas para Comunidades Tradicionaispel
Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial
Presidência da República
Assunto: RES: Composição do CNPC
ResponderExcluirPrezada Selma,
Segue, em anexo, Decreto 5.520 que institui o Conselho Nacional de Política Cultural.
Abaixo, a composição (assentos) do Plenário do CNPC.
Art. 12. O CNPC e seu Plenário serão presididos pelo Ministro de Estado da Cultura e, em sua ausência, pelo Secretário-Executivo do Ministério da Cultura.
§ 1o O Plenário será integrado pelo Ministro de Estado da Cultura e por: (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
I - dezenove representantes do Poder Público Federal, distribuídos da seguinte forma: (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
a) seis do Ministério da Cultura;
b) um da Casa Civil da Presidência da República;
c) um do Ministério da Ciência e Tecnologia;
d) um do Ministério das Cidades;
e) um do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome;
f) um do Ministério da Educação;
g) um do Ministério do Meio Ambiente;
h) um do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão;
i) um do Ministério do Turismo; (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
j) um da Secretaria-Geral da Presidência da República; (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
k) um do Ministério das Comunicações; (Incluído pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
l) um do Ministério do Trabalho e Emprego; (Incluído pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
m) um do Ministério das Relações Exteriores; e (Incluído pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
n) um da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República; (Incluído pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
II - quatro representantes do Poder Público dos Estados e Distrito Federal, sendo três indicados pelo Fórum Nacional de Secretários Estaduais de Cultura e um pelo Fórum Nacional dos Conselhos Estaduais de Cultura; (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
III - quatro representantes do Poder Público municipal, dirigentes da área de cultura, indicados pela Associação Brasileira de Municípios, Confederação Nacional de Municípios, Frente Nacional de Prefeitos e Fórum dos Secretários das Capitais; (Redação dada pelo Decreto nº 6.973, de 2009)
IV - um representante do Fórum Nacional do Sistema S;
V - um representante das entidades ou das organizações não-governamentais que desenvolvem projetos de inclusão social por intermédio da cultura, por escolha do Ministro de Estado da Cultura, a partir de lista tríplice, organizada por essas entidades;
VI - treze representantes das áreas técnico-artísticas, indicados pelos membros da sociedade civil nos colegiados setoriais afins\
Em 8 de abril de 2013 22:03, Francisco das Chagas Silva Chagas escreveu:
ResponderExcluirGrato companheira Silvany pelo pronto retorno. Prova, por esta atenção dispensada, a sua preocupação com mais este indicativo, e indicador, do racismo em nosso país - na sociedade política (gestores,governo) e na sociedade civil (cnpc) -, e clareza que você tem dos espaços, estratégias e ferramentas contemporâneas de gestão democrática popular, imprescindíveis para avançarmos nessa correção e reparação histórica.
Temos então uma boa pauta pro novo CNPIR, a participação da SEPPIR no CNPC. E esta será demandada pelo representante da Rede Amazônia Negra -RAN.
Um forte abraço AMAZONEGRINO.
Te amo!
Prof. CHIQUINHO
Em 9 de abril de 2013 00:15, Etétuba escreveu:
ResponderExcluirBom saber que a SEPPIR ainda não tem conselheiro no CNPC, pois tinham representantes de varios ministerios e eu perguntei pelo da SEPPIR, e me foi respondido como se fizesse parte e ali não estivesse.
Mas o importante é que os agentes da cultura foram conservadores ao debater cotas no regimento da 3 CNC, só que é um elenco que odeia ser chamado de conservador, e se bombadearmos os artistas e gestores culturais falando dessa necessidade e das outras esferas de dialogo do governo com a sociedade onde comunidades tradicionais (e/ou o recorte etnico racial) tem cotas de participação, como a segurança alimentar, saúde, meio ambiente, segurança pública.... é possível conseguir ganhos nos estados e com isso tentar garantir a presença, principalmente, das comunidades tradicionais - Vocês sabem que a maioria dos prefeitos de cidades de interior fingem desconhecer a presença de povos tradicionais de matrizes africanas e de quilombos em seus municipios, né!?.
Sei que não vamos mais poder mudar o regimento da 3 conferencia nacional, mas se provocarmos o debate aberto é possível colocar como garantia nos regimentos estaduais.
Enfim, o regimento aprovado ainda não foi publicado, mas não vai ter pre-conferencia setorial, e sem garantias através de reserva de vagas, muito me preocupa a possibilidade de exclusão das culturas afro-brasileiras das delegações estaduais na 3 CNC.
há_braços
Arthur
7 de abril às 07:07 ·
ResponderExcluirEdna Marajoara Arthur Leandro, não podes esquecer a posição dos coselheiros, sómete 3 ,votaram a favor.
7 de abril às 10:48 ·
Edna Marajoara disse: magoei, não pensei que um conselho nacioal de cultura fosse contra reivindicação de povos indigeas e comunidades tradicionais, que é comum termos cotas as conferências é exatamemte para suprir as culturas de bases poderem se manifestar a estadual caso seu municipio não faça parte do sistema nacioal de cultura,
7 de abril às 13:20 ·
Edna Marajoara não pensei que tivesse que negociar o óbvio
11 de abril, há 2 horas
ResponderExcluirLula Dantas disse: Falta de comprometimento com a política da diversidade, falta de respeito aos Povos Tradicionais. Em outras conferências, de outras áreas, temos essa participação assegurada, na pasta cultura existe uma paralisia da política pública de promoção da diversidade. A Secretária Marcia Márcia Helena Gonçalves Rollemberg e o Pleno do Conselho Nacional de Políticas Culturais foram extremamente incoerentescom esse posicionamento. Lamentável!!!!